Apresentação
HISTORIA E IMAGEM: PESQUISAS EM CURSO
Escrever sobre a imagem. Não sobre uma especificamente, mas sobre várias. Escrever sobre imagens. As diversas leituras acerca da imagem levaram-nos a perceber, não só a complexidade do tema, mas também as variadas modalidades de abordagem e de caminhos metodológicos.
“A imagem sempre está fora de nossos olhos”1. No exato momento em que a reconhecemos, ela desaparece. É inapreensível. A imagem de um casamento, de um batizado, a imagem de uma mãe, enfim, a imagem de um referente. Entretanto a imagem não necessariamente precisa ser a imagem de alguma coisa. Esta é uma de suas potências. Ela pode estar ligada a um referente, mas ela não é simploriamente apenas o referente, apenas o retratado. Ela é uma imagem. Uma imagem pode atrelar-se a um representado, a um acontecimento; mas, se deste modo estiver, ela nega-o. A imagem pode recuperar o objeto, a pessoa ou o acontecimento que já não é. Todavia, no exato momento em que o recupera, ela marca sua ausência. Não constitui mera representação, também constitui apresentação tornando-se o próprio acontecimento. A imagem apresenta. Essa constitui sua soberania.
Somos a civilização da imagem. Afirmativa que ouvimos tanto nas mídias quanto de inúmeros estudiosos. Somos cercados por imagens, dos mais diversos tipos, dos mais diferentes tempos, de uma infinidade de modos e de formas. Estas imagens chegam até nós através de abundantes suportes: são páginas de livros, de revistas, outdoors. Essas imagens nos dizem muito sobre as sociedades que, de alguma forma, as produziram ou conviveram com elas. Mesmo com a conquista do alfabeto e da escrita, o homem não deixou de produzir imagens. E se outrora a imagem não constava do repertório do historiador no tratamento metodológico de seus temas, hoje são inúmeros os trabalhos historiográficos que vêem na imagem e seus suportes um campo profícuo.
Assim, na atualidade para além de uma história da arte deparamo-nos com uma história da imagem, uma história do objeto do ver. Uma história que atenta, sobretudo, para o visível. No rol das disciplinas, convencionou-se tratar os estudos visuais, a partir da década de 1990, como The visual Turn com suas metodologias para refletir e abordar a imagem, as percepções e modos de olhar. O caminho percorrido pelos historiadores que abordam a imagem como objeto de suas pesquisas envolve, contudo, determinação e esforço.
São exemplos desta determinação e esforço que queremos mostrar aqui. Os trabalhos apresentam-se como resultante de uma proposta bastante simples, todavia assinalam extrema relevância. Trata-se de resultados de pesquisas para elaboração de teses e dissertações dos alunos do Programa de Pós Graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina que têm no seio de seus projetos de pesquisas questões relativas à imagem. Os textos aqui organizados escrevem linhas, parágrafos e páginas sobre a imagem. Imagem que se mostra e que vem sendo percebida por historiadores como meio, suporte, objeto e problema de pesquisa.
Os textos aqui reunidos visam não apenas promover diálogos entre diversas linhas teóricas e metodológicas, como também diversos usos e concepções da imagem. Deste modo a publicação resulta da sessão nomeada “História e Imagem: pesquisas em cursos”, do IV Colóquio de História e Arte, de Florianópolis, promoção da Linha de Pesquisa “Política, escrita, imagem e memória” do Programa de Pós Graduação em História da UFSC. A sessão “História e Imagem: pesquisas em cursos” marca, não só um expressivo número de pesquisadores dedicados a imagem, mas também suas inúmeras formas de apresentação e problematização dentro da pesquisa histórica. A imagem aqui é tratada para além
de suas antigas amaras, de um rígido estatuto de arte. Ela transcende tais limites. A imagem aqui discutida é a imagem dita artística, a imagem fotográfica, a imagem da ilustração, a imagem do quadrinho, a imagem do cinema. O debate visa permear os aspectos de produção, circulação,
legitimação e interpretação do objeto imagético. Deste modo, esta publicação organiza-se em eixos que podem se tomados como eixos temáticos ou eixos metodológicos: cidades, artes gráficas, fotografia e cinema. Em suma, abordam a multiplicidade do objeto imagético.
Os escritos sobre imagens aqui reunidos tratam de imagens gravadas, pintadas, esculpidas, desenhadas, fotografadas, filmadas, impressas. Imagens tão presentes e quase tão antigas quanto a própria existência humana. Inscrições em rochas, máscaras fúnebres,
estatuárias de deuses, pinturas de reis e nobres, telas de grandes “fatos históricos”, fotografias, filmes, retratos. Homens e mulheres de diversas temporalidades e suas relações com diferentes tipos de imagens. Historiadores que diante do tempo também estão diante de imagens.
Laboratório de História e Arte – Labharte.
1 SOUZA, Eudoro de. História e Mito. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1981. p.3.